O tema fez parte do VI Conaffa e foi apresentado na quinta-feira (27), no último painel da programação.
Com o tema “Enfrentamento ao assédio institucional”, o último painel do VI Conaffa reuniu dois especialistas que trouxeram abordagens diferenciadas acerca do tema. João Monteiro Neto, advogado sênior e sócio do escritório Torreão Braz, iniciou a exposição fazendo uma correlação entre assédio institucional e a reforma administrativa. Informou que o escritório Torreão Braz fez um parecer apontando a manifesta inconstitucionalidade da PEC 32 e o manifesto assédio institucional do Governo Federal em relação a seus servidores. “Uma das expressões do assédio institucional é a PEC”, explicou o advogado e informou também que havia uma limitação material à edição de PEC em estado de emergência, no momento em que ela foi editada.
O assédio, na verdade, é “desinstitucional”, porque elimina as instituições democráticas e a República. “Toda medida imprudente, arbitrária é, por natureza, assediadora. Isso não convém a uma República. Portanto, no assédio institucional não é vítima apenas a servidora ou o servidor. Todas as circunstâncias fáticas que tratam de assédio e atacam a servidora e o servidor na sua dignidade humana, minam as instituições. Então, trata-se de assédio institucional, de atacar os fundamentos de uma República democrática”, reforçou João Monteiro.
Segundo ele, a primeira medida de enfretamento do assédio é a proteção do assediado. “Por isso, o assediado não pode lidar com o problema sozinho. E daí, a importância do Sindicato. Este é um problema muito sério, que não ataca apenas a dignidade humana da vítima, mas também as instituições democráticas”, reforçou.
O advogado do Torreão Braz fez um apanhado dos principais aspectos jurídicos que envolvem o assédio institucional. Citou o Código Civil e relacionou também o Código de Ética. “O assédio institucional não é apenas um desvio do poder diretivo hierárquico. Pode ser também ascendente. Um subordinado pode ser agente de assédio de seu superior hierárquico, mas o assédio também pode ser horizontal, ocorrer entre colegas de trabalho”, informou.
Abordou artigos do Código de Ética que vedam a situação de assédio. Mencionou a comissão de ética, no Ministério da Agricultura, lembrando que ela pode agir de forma proativa para inibir o assédio.
Ao concluir sua exposição, falou sobre o pedido administrativo indenizatório, como uma das hipóteses de reparação para casos de assédio institucional. Informou que nesse caso, o poder público também pode deferir indenização por dano patrimonial, na esfera administrativa, sem ação judicial.
O moderador do painel, Rogério Ferreira da Silva, diretor de assuntos jurídicos do ANFFA, comentou a realidade cruel do acervo de provas da vítima, em casos de assédio institucional. “Infelizmente, trata-se de uma luta contra uma máquina poderosa, que se usada pelo mal é muito destrutiva, causando danos morais, psíquicos, adoecendo de fato o servidor vítima de uma situação constrangedora e absurda”, lamentou.
Poder e assédio
O doutor em ciências econômicas pela Unicamp, José Celso Cardoso Júnior, presidente da Associação dos funcionários do Ipea (Afipea), trouxe exemplos reais de assédio institucional, no contexto do atual governo. Destacou a importância de diferenciá-lo do assédio moral ou sexual. “As pessoas que se envolvem em casos de assédio moral são pessoas que em geral convivem no mesmo ambiente de trabalho”, explicou.
“O assédio, como um fenômeno típico das relações de trabalho, muito presente, sempre existiu nas relações de trabalho de modo geral, no setor público e privado, em todos os tempos”, destacou. “Vivemos algo novo e perturbador desde 2018: a escala de ocorrências de casos de assédio aumentou enormemente. E não só nos nossos ambientes tradicionais e corriqueiros de trabalho, no dia a dia”, afirmou e listou casos como o da demissão do ex-presidente do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), porque sua instituição divulgava dados de destruição da Amazônia, que contrariava interesses do Governo; o do fiscal do Ibama, que foi demitido e deslocado do local de trabalho”, destacou e citou outros casos da administração pública.
José Celso também mencionou a variabilidade de situações que podem ser enquadradas como assédio institucional. “Não é possível conduzir a PEC 32 por um processo de açodamento, como foi. Tentaram fazer de forma célere, em meio à pandemia, por vários subterfúgios que desqualificam o processo”, exemplificou, ao citar fenômenos que estamos vivendo no Brasil. Mencionou seu livro: “Assédio institucional no Brasil” e o subtítulo – “o avanço do autoritarismo e a desconstrução do Estado nacional”. Em seguida esclareceu que o avanço do autoritarismo ocorre pela forma que o fenômeno assume; e a desconstrução do Estado, pelo desmonte constitucional, sem amparo do processo constituinte.
O que fazer diante disso? Questionou e afirmou que o cidadão tem três opções de atuação, nesse caso de assédio institucional: “no nível macro, ele pode reverter a continuação desse poder por meio do voto; no nível organizacional, pela remontagem dessas organizações, o que exigirá esforço coletivo; e também poderá agir em nível de consciência, porque assim estará ciente de que todo e qualquer ato de governo tem implicações individuais”, avaliou.