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Reforma da previdência pode comprometer reeleição, sim!

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Todos estão de acordo sobre a necessidade de adequação da legislação previdenciária aos indicadores demográficos e também aos critérios financeiros e atuariais, mas o que se está fazendo nesse momento é pura mistificação.

Todos estão de acordo sobre a necessidade de adequação da legislação previdenciária aos indicadores demográficos e também aos critérios financeiros e atuariais, mas o que se está fazendo nesse momento é pura mistificação.

Sob o pretexto de evitar a falência do sistema previdenciário, governo, empresários, Banco Mundial, imprensa e até funcionários públicos se somam para mentir para a população, passando a falsa ideia de que, uma vez feita a reforma da previdência, as finanças públicas voltam a ficar em ordem, já que se enfrentaria um déficit monumental.

A alegação é de que com as atuais despesas previdenciárias não sobram recursos para a educação, para a saúde ou para a segurança, passando a ideia de que seria possível ampliar o gasto com essas outras rubricas, desde que se fizesse uma reforma na previdência. É mentira.

Desde que entrou em vigor a Emenda à Constituição nº 95, que congela o gasto público em termos reais por 20 anos, o orçamento terá como parâmetro a despesa do ano anterior, corrigida pelo IPCA, e não mais a receita. Logo, mesmo que haja aumento da receita não pode haver aumento de gasto, já que toda a receita nova será destinada a abater déficits ou, na ausência destes, gerar superávit e utilizá-lo, integralmente, no pagamento dos juros e do principal das dívidas interna e externa.

Nessa campanha pela reforma da previdência, propositadamente, misturam dados e informações sobre supostos rombos que não serão resolvidos pela reforma, já que os benefícios em usufruto, tanto no setor público quanto no setor privado, vão continuar sendo pagos e não existe reforma ou mágica que faça essa despesa desaparecer, como querem fazer crer os defensores da reforma já e a qualquer custo.

A diferença hoje existente entre o que se arrecada do servidor e do ente público, na medida em que não houve reserva ao longo das décadas de pagamento de contribuição antes do usufruto do benefício, vai continuar existindo para os atuais aposentados e pensionistas, porque o sistema de repartição requer reposição de quadros, e isto não tem sido feito, especialmente nos governos neoliberais. Aliás, a própria EC 95 exclui do computo da despesa, para fins de limites, a contratação de pessoal para substituir quem se aposentou.

Para manter um benefício de um aposentado ou pensionista, é necessária a contribuição de pelo menos quatro ativos, e hoje a relação é praticamente de um por um no serviço público e de 2,5 por um no regime geral. Logo, num sistema desses, considerando só a receita atual de contribuições, haverá déficits e não tem reforma que resolva isso, exceto se cortar os benefícios.

Assim, utilizar uma informação que não será afetada pela reforma para justificar sua realização é, no mínimo, desonestidade intelectual. Qualquer reforma que se faça poderá retardar aposentadoria e até reduzir o valor das aposentadorias e pensões daqueles que ainda não preencheram os requisitos para fazer jus ao benefício, mas nenhum impacto terá, a curto prazo, em relação aos supostos “déficits” atuais.

Promover ajustes no sistema previdenciário, com respeito aos direitos adquiridos e aos direitos acumulados, com regras de transição para os que estão em processo de aquisição de direito, e com novas regras para os futuros segurados, é fundamental, mas respeitando-se a isonomia entre os dois sistemas (regimes próprios do servidores e regime geral) e não utilizando o argumento da isonomia e aplicando critérios distintos, com desfavor dos atuais e futuros servidores.

Alguma reforma é necessária, porque, embora já tenha sido feita para os servidores públicos federais – com adoção de idade mínima e a quebra da paridade e integralidade para os que ingressaram entre 2004 e 2013 e a limitação dos benefícios ao teto do INSS, desde que foi criada a previdência complementar da União em 2013 – alguns Estados e Municípios ainda não adotaram a previdência complementar e no INSS não existe idade mínima, ainda que a formula 85/95 leve a uma idade mínima e o fator previdenciário reduza drasticamente o benefício de quem se aposente antes de completar 60 anos de idade, mesmo tendo mais de 30 de contribuição.

O fato de reconhecer a necessidade de alguma reforma não significa que seja feita a toque de caixa e com agressão a direitos, até porque não produzirá nenhuma economia significativa a curto prazo e se prestará, no formato apresentado, para privatizar a previdência pública, abrindo mercado para os bancos e seguradoras privadas. Pode-se, perfeitamente, esperar um governo legítimo para fazê-la, com respeito à expectativa de direito e sem o objetivo de punir determinados segmentos dos assalariados nem de favorecer bancos e seguradoras privadas, como é o caso da atual reforma, inclusive em sua versão “enxuta”.

Para levar a cabo a reforma da previdência, que faz parte de mais uma entrega desse governo ao mercado financeiro, o governo mente, manipula dados e envolve até inocentes úteis nesse processo, como determinados funcionários púbicos, que emprestam sua capacidade intelectual para manipular informações sem a devida contextualização.

Quando se afirma que os deputados que votaram a favor da reforma da previdência de FHC, em 1998, tiveram melhor desempenho nas urnas que aqueles que votaram contra, sem informar que naquele período havia financiamento empresarial de campanha, o ambiente era de satisfação popular com o plano real e o presidente FHC era muito popular e candidato à reeleição – e que o governo e o mercado compensaram regiamente os parlamentares com perspectiva de poder e recursos de campanha pelo apoio à reforma – está-se induzindo os atuais deputados a votarem a favor sob o fundamento de que, com isso, renovar seus mandatos.

Mas o atual presidente não é popular, não existe financiamento de campanha, não há satisfação popular nem as perspectivas são boas para o povo, e os parlamentares já votaram matérias impopulares – como a reforma trabalhista e o congelamento do gasto público – e comprometeram suas biografias votando pela absolvição de denunciados por vários crimes, inclusive formação de quadrilha, e que, portanto, o eleitor não irá tolerar que votem mais uma vez contra a maioria do povo, aprovando uma reforma da previdência que pune servidores, trabalhadores do setor privado, e beneficia bancos e seguradas privadas.

Outra manipulação em curso, também com fins de favorecer o mercado, é a campanha de combate aos supostos privilégios dos servidores públicos, porque facilita o desmonte do Estado e a entrada do mercado na venda e prestação de serviços públicos. Depois que a onda pseudo-moralista do combate à corrupção cumpriu seu papel, ou seja, afastou a presidente Dilma e permitiu aprovar várias reformas pró-mercado, agora precisa estancar a Lava-Jato, que avança além do PT, pegando seus próprios incentivadores. Para esvaziar a Lava-Jato nada melhor do que escolher outro inimigo, no caso os servidores públicos.

O momento requer reflexão. Todo o apoio da mídia e do mercado à reforma, nessa reta final da sessão legislativa, também tem o objetivo de desviar o foco das proposições que aumentam desonerações como a MPV 795 que promove uma trilionária desoneração do setor de petróleo e gás, ou que podem aumentar receitas públicas – poupando o empresariado do pagamento de algumas dezenas de bilhões em tributos – como é o caso da MP que tributa os fundos fechados de investimento, e do projeto de lei que trata da reoneração, que deixarão de ser votados e isentam o setor empresarial do pagamento desses tributos já a partir de 2018.

A reforma – exceto se todos os partidos da base fecharem questão, o governo liberar mais recursos do que irá economizar com ela – não será aprovada, mas fortalece determinadas figuras públicas perante o mercado e, mais importante, isenta este (o mercado) do aumento de tributos no ano de 2018, porque todo o foco e esforço foi deslocado para a reforma, mesmo sabendo que ela não teria chances reais de aprovação.

(*) Jornalista, Analista Político e Diretor de Documentação do Diap.

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