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Autocontrole: avanços, riscos e limitações

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O controle rastreável dos estabelecimentos regulados pela Secretaria de Defesa Agropecuária (SDA) sobre seus processos de fabricação, utilizando ferramentas de controle de qualidade, a fim de alcançar as especificações de qualidade e segurança dos produtos, não é novidade nos regulamentos das distintas áreas de atuação da SDA, sob diversas nomenclaturas.

Por: Antonio Andrade (diretor de Política Profissional do Anffa Sindical)

O controle rastreável dos estabelecimentos regulados pela Secretaria de Defesa Agropecuária (SDA) sobre seus processos de fabricação, utilizando ferramentas de controle de qualidade, a fim de alcançar as especificações de qualidade e segurança dos produtos, não é novidade nos regulamentos das distintas áreas de atuação da SDA, sob diversas nomenclaturas. Embora com desníveis quanto à aplicação em cada área.


 

O autocontrole alcançou notoriedade no Mapa após a posse da Ministra Tereza Cristina. Inicialmente mal compreendido, por um lado como autofiscalização e auto registro, por outro como terceirização, foi aos poucos desmistificado, embora ainda reste resquícios.

Não por acaso, a primeira reunião do Comitê Técnico Permanente de Programas de Autocontrole do Mapa, do qual o Anffa Sindical participa como convidado, parecia uma Torre de Babel. Ficou claro que o primeiro passo seria uniformizar parâmetros básicos do que seria autocontrole no âmbito da Defesa Agropecuária. Arredondando, os componentes chegaram ao ponto que, se não pensam uniformemente, ao menos expressavam, ou silenciam, alinhados.

No começo, buscou-se atuar em áreas específicas. Algo como pilotos. Mas as diferenças entre as áreas solidificaram a necessidade de uma liga, uma amarração, como um guarda-chuva comum, a dar cobertura às especificidades. Foi aí que a SDA, a toque de caixa, tirou da manga uma proposta de Medida Provisória (veja apresentação institucional).

A proposta uniformiza o conceito e institui a obrigatoriedade básica de implantação, manutenção e verificação de programas de autocontrole, considerando a atividade econômica, o porte da empresa e os riscos à economia nacional e à saúde pública.
Por outro lado, a proposta concebe um programa opcional, denominado AGROCONTROLE, para níveis avançados de comprovação da implantação, manutenção e verificação de programas de autocontrole.

Portanto, a proposta tem um viés obrigatório, aliado a um programa opcional. Os comandos logicamente são gerais, ficando o detalhamento para a elaboração dos regulamentos nas diferentes áreas. Sem dúvida é um avanço. Mas, como todo o avanço, traz consigo alguns riscos.

Na fase obrigatória, a conferência ao atendimento dos requisitos de autocontrole, segundo a proposta, poderia ocorrer por meio de certificação de entidade de terceira parte. A compreensão do Anffa Sindical, expressa à SDA, é que essa fase, por ser obrigatória, deveria permanecer sob integral domínio da Administração Pública, podendo a fase opcional, de adesão e manutenção aos níveis avançados do Programa AGROCONTROLE, contar com a participação de certificações de entidades de terceira parte.

Para promover a participação no Programa AGROCONTROLE, a proposta autoriza a instituição de um conjunto de “incentivos e benefícios” aos agentes econômicos, provavelmente voltados à frequência de fiscalização, emissão de certificados, declarações e outras ferramentas de controle.

Muito lógico que empresas que demonstrem maior controle de seus processos permitam ao Mapa direcionar suas ações fiscalizatórias para outras, que não estariam no mesmo nível. O problema é que sob vários aspectos, tais ações já foram distendidas ao extremo, em função da escassez de pessoal, de orçamento e de condições físicas de trabalho.
 

Com efeito, o orçamento da SDA, que não alcança sequer 10% do destinado ao Mapa, sofre com a ausência de taxas sobre os serviços prestados, cuja arrecadação reverta-se integralmente à Secretaria. É um dos poucos países do mundo capitalista, senão o único, cujos serviços são inteiramente gratuitos.

Com o déficit orçamentário e a falta de pessoal, as fiscalizações in loco, por exemplo, já acontecem em espaçamentos inadmissíveis para ainda permitirem incentivos e benefícios. Dividindo o número de estabelecimentos registrados pelo número de auditorias realizadas por ano, segundo relatório de auditoria do TCU, chega-se à aterradora conclusão que, em algumas áreas, a empresa pode levar mais de uma década sem ver um Auditor Fiscal Federal Agropecuário (Affa). Mesmo que os Programas de Autocontrole permitam direcionar as ações de fiscalização, ainda assim os números de fiscalizações in loco são insuficientes.

Os baixos valores das multas em algumas áreas, em contrastes com outras, prestam-se ao papel de incentivar a infração administrativa, ao invés de penalizar o infrator, prevenir a reincidência e educar concorrentes. Os valores das multas deveriam ser proporcionais aos dividendos auferidos com a infração e o instituto da desconsideração da autonomia patrimonial da pessoa jurídica deveria ser considerado, em alguns casos, a fim de atingir os bens dos sócios ou dos administradores, preservando a função social da empresa. 

Em verdade, poucas áreas contam com instrução legislativa básica do processo administrativo agropecuário que estabeleça graduações das infrações administrativas, desde a básica advertência até ao cancelamento do registro, ou que reconheça a reincidência, por exemplo. Sem esse instrumento, as sanções não alcançam a devida proporcionalidade com a infração.

 

Pensando em maior aporte de informações a partir dos dados dos agentes econômicos que implantarem os programas de autocontrole, é fundamental ao Mapa definitivamente pôr os pés no chão, sair do discurso 4.0 e permitir aos Auditores disporem de suporte de tecnologia da informação que, nas palavras do TCU, não sejam obsoletos, intermitentes, meramente cadastrais, sem interface gráfica, inseguros e com erros nas funcionalidades. O discurso da “digitalização” não pode servir apenas para impedir a realização de concursos públicos.

 

 

Por fim, a velha questão da falta de Auditores. Em 2010 o Valor Bruto da Produção Agropecuária não passava de R$ 261 bilhões. Em 2020 alcançou R$ 630 bilhões. No mesmo período, o número de Affas em atividade passou de 4.040 para aproximadamente 2.533. 

É admissível que o crescimento e diversificação do agronegócio exijam maior participação da sociedade organizada e de seus agentes econômicos nas atividades de Defesa Agropecuária. Tal afirmação, vinda de um sindicato, pode até soar como heresia. Mas a realidade nos impõe tal conclusão. Porém, a manutenção do poder de polícia administrativa do Mapa deve ser preservado, sobre todos os arranjos institucionais possíveis. Caso contrário, voltaremos ao estado de natureza hobbesiano em que o homem será o lobo do homem.

Os desafios são imensos. E tudo vai para regulamento! Mas há notícias auspiciosas. Há projetos na área de tecnologia da informação que mostram luz ao final do túnel, a exemplo do shiVa, do e-CERT, do e-Phyto e do Hub Laboratorial. Com satisfação, em matéria do jornal Valor Econômico, a SDA informa que utilizará para o projeto de implantação do Autocontrole cerca de R$ 15 milhões, advindos do Banco Interamericano de Desenvolvimento.

Os desafios são imensos. O Programa de Autocontrole apresenta avanços e, com eles, riscos e limitações. Os Auditores Fiscais Federais Agropecuários, dentro e fora da SDA, continuam firmes no propósito de oferecer ao País o melhor serviço que suas condições de trabalho permitirem. 

 

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